quarta-feira, 29 de julho de 2009

FRONTEIRAS DO DESCONHECIDO

Primeiro aprendi a contemplar o céu e deixei meu olhar se perder na imensidão azul. Depois, descobri nas nuvens uma incrível magia de formas como se fossem ilustrações de um gibi da alma. Depois, tive que aprender a observar a escuridão e meus olhos descobriram aos poucos os pontos cintilantes tão distantes quanto a vontade de se possuir um diamante. As estrelas estavam lá apontando para o infinito... Tempos depois fui descobrindo o encanto desses seres alados que batem suas asas de um lado para outro, dando um toque todo especial à paisagem. Pássaros multicores disputando espaços com as andorinhas acizentadas. Libélulas dando rasantes por sobre as águas e nas flores, colibris e borboletas em sua dança inimitável. Foi assim que meus olhos despertaram para os encantos da existência e muito tempo depois é que meu coração foi entender o perfeito sincronismo do universo. Tudo parecia ser e acontecer apenas no meu jardim. Porque aquilo tudo era o meu mundo e, embora houvesse o desconhecido, ele jamais havia atiçado minha curiosidade. As fronteiras desse desconhecido eram as mesmas que delimitavam a minha alma e portanto, o meu jardim , embora fosse uma partícula do universo, era o meu gigantesco mundo. Não haviam outros olhos que pudessem se perder em todas aquelas maravilhas e o que eu não sabia, era que outros olhos haveriam de pincelar sorrateiros aquilo tudo sem, no entanto, assimilar absolutamente nada; a não ser o meu segredo maior, que era apenas e tão somente o meu olhar. Aqueles olhos passaram como um cometa brilhante e me fizeram, pela primeira vez, pensar nas possibilidades do desconhecido, a começar por aqueles olhos flamejantes e inoportunos. Mas apesar disso me mantive em meus domínios embora algo estranho se processasse nos confins da minha alma. Sim; ela passou por aqui batendo suas asas de cristal tão frágeis, vôou ao redor de tudo e depois desapareceu no horizonte para sempre. Ficaram mais coloridas as flores, as aves, os colibris e as borboletas e o que era verde ficou ainda mais vistoso e uniforme. Só meu coração é que pulsava diferente, porque mesmo que eu não aceitasse, havia descoberto uma possibilidade e ela se chamava paixão. Aprendi então a me apaixonar, ainda que platonicamente.... Fiquei pelo tempo vivendo da imaginação e tive que aprender a olhar o universo por outros ângulos. Aprendi a arte da espera e da paciência. Tinha a confiança de que num belo dia ela voltaria, com suas asas vistosas e aqueles olhos que mais se pareciam com dois portais que levavam a um admirável mundo novo. Aprendi também que a espera não valia a pena e segui cuidando do meu mundo e de todos os detalhes que exigiam a ação do meu olhar e a destreza de minhas mãos. Meu jardim; meu mundo – estavam perfeitos, com o céu azulado, a passarada em algazarra e as flores desabrochando a todo instante. E nas noites, lá estavam elas, cintilantes a pulsar no infinito. Aprendi a olhar as estrelas e depois a contá-las até adormecer e mergulhar em meus sonhos mais estranhos. Aprendi também a me debruçar na janela e a ficar compenetrado no nada. Talvez ela estivesse por lá, porque se ela fosse apenas uma ilusão, também seria nada. A verdade é que jamais regressou e passei a admitir que tudo aquilo teria sido sim, uma grande ilusão ou quem sabe uma daquelas miragens que nos atacam nos instantes em que o corpo fraqueja. O tempo sempre foi implacável e nunca parou. O meu jardim, o meu mundo, passaram por transformações significativas também. E certo dia, me peguei diante do espelho e fixei meu olhar em meus próprios olhos. Aquilo me surpreendeu e me assustou. Eu estava frente a frente com alguém que na verdade eu nem conhecia direito. Foi assim que consegui mergulhar naqueles segredos da minha alma e lá, num jardim tão maravilhoso quanto o meu, descobri a presença daquele olhar num ser alado que nada mais era do que a própria transformação. Foi assim que aprendi um pouco mais de quem sou e um tanto a mais de tudo o que me cerca neste imenso jardim. ( Pedro Brasil Júnior ) Curitiba – 29 de julho- 2009-07-29 22h20min *Publicado originalmente na Usina de Letras - www.usinadeletras.com.br